Como identificar uma zona importante de desova de peixes de água doce?

Como identificar uma zona importante de desova de peixes de água doce?
junho 29, 2021 AmazCitSci

Conservando la Cuenca Amazónica Aguas Amazonicas

Fotografia: Omar Torrico – WCS.

Como identificar uma zona importante de desova de peixes de água doce

Miranda-Chumacero et al. 2020 coleta ovos e larvas de peixe para a confirmação de áreas prioritárias de conservação de peixes migratórios

A localização e confirmação de uma zona de desova de peixes de água doce de pelo menos 13 espécies na bacia do rio Beni é um passo importante para uma gestão integrada das bacias hidrográficas. Trata-se de uma questão importante porque, para conservar as populações de peixes, é necessário saber onde e quando ocorrem fases cruciais do ciclo de vida, como a desova ou a reprodução. No entanto, esta informação é difícil de adquirir visto que muitas espécies de peixes, particularmente as que são importantes para os humanos, são migratórias, e por isso seu estudo requer investigação a uma vasta escala espacial e temporal. Ao analisar a experiência descrita neste documento, poderemos guiar-nos na identificação de mais destas áreas prioritárias.

O primeiro passo é decidir onde procurar pela zona de desova. Quem ganha a vida com a pesca terá, muito provavelmente, conhecimento dos locais de desova dos peixes que pesca. Um bom relacionamento com a população local levará à possibilidade de lhes pedir orientação. O investigador principal Guido Miranda, referiu: “Os pescadores locais indicaram que esta era uma boa área porque se pode capturar tanto dourados machos como fêmeas (Brachyplatystoma rouseauxii), e que os piraíbas (Brachyplatystoma filamentosum) não chegavam aos Andes. Isto ajudou-nos a definir a nossa área de estudo”. Uma vez identificada, pode dar-se início à investigação sobre se se trata ou não de uma área de desova.

Ao ter um local, pode-se escolher várias formas de identificar onde e que peixes estão a migrar. Aqui foram coletadas amostras de ictioplâncton (ovos e larvas de peixe) usando-se redes especializadas com pesos, mantidas contra a corrente durante aproximadamente 15 minutos. Estes ovos e larvas foram então separados de outras matérias orgânicas e depois preservados para que o ADN (DNA) pudesse ser extraído e consequentemente sequenciado para a identificação de espécies. Utilizando informação publicada sobre as fases embrionárias (quantos dias leva a espécie ou género identificados para chegar a uma determinada fase) e a velocidade da água do rio, os investigadores puderam estimar a que ponto do rio o ovo pode ter sido desovado. Foi desta forma que os investigadores identificaram esta extensa área de desova, ligando áreas protegidas nacionais e territórios indígenas, e alcançando as encostas dos Andes.

Conservando la Cuenca Amazónica Aguas Amazonicas

Delimitação a montante da área de desova a partir do ponto de amostragem (ponto amarelo), estimada a partir dos ovos nos estágios de morula – gastrula (linha vermelha), e dos ovos no estágio final do embrião (linha laranja). O mapa também indica as ameaças existentes e potenciais na área, assim como os limites da área protegida Madidi e Pilon Lajas e a localização dos territórios indígenas (mais informações).

Em geral, estas espécies são importantes para a segurança alimentar, a subsistência económica e a cultura da população local.

Aqui estão alguns resultados específicos para destacar a importância desta área de desova:

♦ A diversidade críptica das espécies de Prochilodus pode levar à identificação de novas espécies na bacia – que já é uma região megadiversa.
♦ As barragens na Madeira já bloquearam esta região do estuário, pondo em risco os migrantes de longa distância, uma vez que estes não conseguem migrar ao longo de toda a sua extensão. Os resultados deste estudo mostram que nesta área está a desovar o jaú (Zungaro zungaro) em vias de extinção.
♦ Outras zonas do Alto Madeira já foram destruídas por ameaças como a exploração de ouro (ver Madre de Dios), o que sublinha a importância da sua conservação para manter a conetividade de livre fluxo e a integridade ecológica da zona de desova, para que estas espécies migratórias tenham para onde ir.

Uma vez identificada a zona de desova, podemos desenvolver esforços para a conservação da mesma. Os autores descrevem os seguintes passos para esta bacia em particular:

♦ Manter o Beni, Madre de Dios, e Mamoré em fluxo livre, evitando a construção de barragens.
♦Declarar uma proibição de pesca no Alto Madeira para as espécies de peixe mais ameaçadas (como os bagres da família Brachyplatystoma). Isto irá também reduzir o consumo de mercúrio de espécies de grande porte no contexto da exploração do ouro.
♦ Regulamentação e extração por zona, de cascalho e pedra – o movimento irregular de cascalho e pedra pode desgastar e alterar a forma do rio, tornando mais difícil a migração e a sobrevivência das espécies.
♦ Compreender melhor o impacto dos resíduos agro-industriais e da extração de ouro nesta área através da investigação – estas são atividades de subsistência, pelo que a sua compreensão irá ajudar-nos a manter o equilíbrio.
♦ Reforçar os sistemas de monitorização – tanto para a pesca como para as larvas.
♦ Utilizar a ciência para envolver significativamente as populações locais na monitorização e conservação das suas principais espécies de peixes.

Conservando la Cuenca Amazónica Aguas Amazonicas

Por: Natalia Piland.