Para muitos peixes, a floresta é tão necessária quanto a água.

Para muitos peixes, a floresta é tão necessária quanto a água.
fevereiro 27, 2018 AmazCitSci

Em um estudo recente (Arantes et al., 2018; Castello et al., 2017) cientistas utilizaram dados espaciais, dados sobre pesca e amostragens de campo para revelar a relação entre planícies de inundação , a variedade e a abundância de peixes de água doce em um segmento do rio Amazonas no Pará. Quais os resultados? Os pesquisadores descobriam que as florestas das planícies de inundação são extremamente importantes na determinação do tipo de espécies que existem na Amazônia e sua abundância.
No sistema aquáticos estudado, os lagos com uma maior variedade de habitats, e  particularmente aqueles que incluem florestas inundadas, apresentaram maior variedade de espécies (incluindo aquelas que só se alimentam de determinado tipo de comida). Por outro lado, os lagos com predomínio de gramíneas ou hábitat de águas abertas apresentaram um domínio de espécies mais generalistas (as que são encontradas em diversos tipos de habitats). Se pensarmos nos recursos que as florestas alagadas fornecem, essa descoberta faz sentido. Durante o período de  cheia, frutas das florestas alagadas ficam disponíveis aos peixes frugíveros, e diferentes lagos e canais são acessíveis. Nos lagos sem floresta, o tipo de recurso é constante e geralmente prenominam as gramíneas.
A relação entre a cobertura florestal e abundância de peixes é menos  evidente. Os pesquisadores  relacionaram a captura por unidade de esforço (CPUE, quilos de peixe por pescador por dia) com a cobertura vegetal para várias espécies de peixes, inclusive para os dez táxons que respondem por 85% da pesca comercial. Os resultados demonstraram que para a maioria desses modelos, a cobertura florestal era o fator mais determinante para abundância de peixes, e, considerando as espécies separadamente, os efeitos mais  expressivos foram encontrados para a Dourada, Surubim e Tambaqui; por outro lado, para o Aracu e Madi-Moela a influência foi menos significativa. Isto significa que a cobertura florestal é especialmente importante para a presença (e captura) de espécies comerciais Dourada, Surubim e Tambaqui.
Dada a importância destas espécies para a subsistência humana bacia amazônica, especialmente dos peixes comerciais , devemos considerar que as florestas inundadas devem ter alta prioridade para conservação. Tradicionalmente, os ecossistemas terrestres  têm sido priorizados em medidas de conservação da natureza, porém pesquisas como esta demonstram que sistemas terrestres e aquáticos estão intrinsicamente conectados.
Conservando la Cuenca Amazónica Aguas Amazonicas
A maneira como estes sistemas estão conectados e o porquê da importância dessa conexão varia dentro da própria da bacia amazônica. O ecologista de água doce, Dr. Carlos Cañas, da WCS Peru, sugere que “no Peru, o efeito pode ser diferente dependendo do segmento do rio. Por exemplo, nas cabeceiras, a floresta ripária tem o papel crucial no controle da erosão, uma vez os  sedimentos não são mantidos em suspensão. Esta relação é distinta da apresentada em  estudos que descobriram que floresta inundada é mais importante como fonte de alimentos. ”
Ainda é necessário investigar a relação direta entre o desmatamento e a biodiversidade de peixes nas cabeceiras das bacias do Peru, entretanto pesquisas realizadas em outros países confirmam a existência destes padrões diferentes. Em 94 cabeceiras das bacias de Santarém e Paragominas, no Brasil, o desmatamento esteve relacionado com mudanças positivas na variedade de espécies, no entanto nesses lugares, a taxa de desmatamento era de apenas de 30% (Leitão et al., 2017).  Em uma análise sobre a biodiversidade de peixes nos Andes tropicais, descobriu-se que o desmatamento teve um efeito homogeneizador: em áreas no Equador onde a cobertura de floresta ripária era baixa, foram encontradas mudanças em apenas um tipo de peixe – o tipo que se alimenta de periphyton, ou de organismos que se aderem à plantas que  dos sedimentos no fundo (Anderson e Maldonado-Ocampo 2011).
Está claro que a floresta tem impacto sobre a comunidade de peixes da Amazônia. A medida que avançamos  em direção a um manejo integrado e sustentável da bacia, pesquisas que esclareçam a diversidade de causas e efeitos entre cobertura terrestre e biodiversidade, tanto em composição quanto em abundância de espécies, serão fundamentais.
Referências
Anderson, E., and J. Maldonado-Ocampo. 2011. A regional perspective on the diversity and conservation of tropical Andean freshwater fishes. Conservation Biology 25(1): 30-39. doi: 10.1111/j.1523-1739.2010.01568.x
Arantes, C., et al. 2018. Relationships between forest cover and fish diversity in the Amazon River floodplain. Journal of Applied Ecology 55:386-395. doi: 10.1111/1365-2664.12967
Castello, L., et al. 2017. Fishery yields vary with land cover on the Amazon River floodplain. Fish and fisheries 00:1-10. doi: 10.1111/faf.12261
Letão, R. P., et al. 2018. Disentangling the pathways of land use impacts the functional structure of fish assemblages in Amazon streams. Ecography 41: 219-232. doi: 10.1111/ecog.02845
Escrito por Natalia Piland.